Thursday, November 09, 2006
E chega a oitava parte do conto já quilométrico dos Zuagires de Kuthar. Hoje é dia nove de novembro. Um mês atras tracei uma meta que hoje estou cumprindo, que era esta: estar vivo. Pois é. Pra maioria pode ser banal, mas é ousado e pretencioso traçar esse tipo de meta. Mas que minha simplicidade fique de lado por alguns instantes enquanto saboreio este momento de vitória. Calculem quantas pessoas já morreram por este ou por aquele motivo durante vinte e oito anos. Pois é. Eu não estou na lista. Pode ser sorte, pode ser proteção divina ou eu posso ser matreiro, mas é isso, porra! Estou vivo! Infelizmente algumas pessoas de quem gostei muito não podem gozar deste meu momento de júbilo. Gostaria de brindar por eles, especialmente pelo meu saudoso amigo do curso, Flávio. Foi esse ano... O destino ou alguma força qualquer privaram-nos de compartilhar de sua risada amiga, de sua ironia mordaz e de sua sutil genialidade. Não apenas um leitor voraz de Gabriel Garcia Márquez, nem apenas um escritor resignado e afiado, e nem também apenas um colega de horas para excelentes prosas. Um amigo. Nada traduzível, por mais letras que conheçamos. Uma mesa vazia no banquete, pois era uma pessoa que ainda tinha muita coisa pra oferecer nessa vida nossa. Perdemos muito, acreditem todos, com a passagem dele. Inspiradora foi sua presença em minha vida. E quisera poder ter melhores argumentos para relembrá-lo. Era simples. Não deveria ser lembrado com floreios ou firulas. Era especial e merecia algo melhor que esta minha pálida homenagem. Mas estou vivo e vou sempre me lembrar dele. Essa minha vitória hoje tem um sabor melhor que antes dele, pois sei que compartilhei momentos bacanas com ele enquanto conversávamos no quiosque ao lado de nosso bloco na faculdade. ATé na sala de aula a gente falava um bom tanto. Até jogamos RPG por lá. Foi especial ter recebido tanto do tempo que ele teve na terra. Tempo breve. É isso. Saudade tem sido uma companhia constante. Por ele permanente. Me fez lembrar que a saudade que sinto de pessoas queridas hoje distantes... grandes amigos... gente especial pra mim... amores... são saudades dolorosas que devem ser vistas com menos egoísmo por mim. Afinal se estou vivo aquí com tantas lembranças boas... é um presente e uma sorte. E é sua também. Sou grato pelas companhias que tenho e tive. Hoje estou aquí, vivo. E é uma puta farra estar vivo!
...
Ah, é, o conto:
Aratrustra
Halder veste uma armadura composta de placas de ferro bastante brilhantes, coberta por uma capa azul, como são as cores do brasão de seu reino. Sobre o lado direito de seu peito um medalhão engastado com o símbolo de seu deus Péleas, protetor dos guerreiros de causa justa. Mas sob esta armadura, sob os músculos treinados e os nervos aguçados, um homem angustiado por uma busca interior infinda se questiona que crime sua alma cometeu para ser atirada neste mundo injusto. Os olhos azuis do paladino se espremiam para distinguir formas nas ruas confusas de Aratrustra. Mercados apinhados de mulheres infelizes e homens malcheirosos formavam um imenso corredor até o centro da cidade, onde o castelo do sultão Agbalor apontava para um céu azul e nu. O próprio vento soprava quente o cheiro de excrescências que corriam por valas sob a narina de todos. Casas de argila seca, telhados de folhas brancas e poeira calcinante faziam a vista doer com tanta alvura. Os homens de Halder então começaram a se entreolhar. Treinados pelo devoto de Péleas por longos anos, já sabem quando algo está errado apenas pela forma com que o paladino segura o cabo de sua arma. Nervosamente batendo os dedos na bainha enquanto tensamente parece estar prestes a sacar a lâmina consagrada de sua espada. Alguns transeuntes se dirigem até o grupo de guerreiros desatentamente enquanto conversam. Então se cruzam de forma confusa, como quem esbarra sem perceber que as rotas se cruzavam. Os nativos então pedem licença e continuam conversando enquanto passam pelo grupo de aventureiros. Balonius então canta:
A bondade de um homem tolo Em ceder de seus bens Só não é maior Que a malícia torpe Do homem que lhe tomou o ouro
Finéas, um dos aventureiros do grupo percebe que seu pequeno saco de dinheiro sumiu. Felizmente o bardo foi rápido nas notas e quando o guerreiro se deu conta do furto ainda tinha os perpetrantes ao alcance de seu aço. Um imenso machado de duas lâminas traçou uma meia-lua no ar, e como a estrela cadente toca o horizonte mansamente, abriu o ladrão num baque surdo e discreto. O infeliz ainda deu dois passos antes de perceber que havia sido agraciado com o golpe cruel de um mestre de armas. Seu corpo se abriu no meio de uma de suas palavras, diante dos olhos incrédulos de seus amigos. Assustados contemplaram o grupo vindo do Vale das Névoas, que furioso sacava lentamente suas exóticas armas. -Não nos matem, senhores! Somos apenas transeuntes comuns vindo de um bar e sem bens que lhes interessem. -O ouro que aquele homem porta em sua mão direita, agora distante alguns metros da mão esquerda, me pertence. Eu sou Finéas Randomblade, cavaleiros do vale. Não um tolo aguardando um punguista. A rua toda então se comoveu com toda a confusão e não levou mais de dois minutos até a guarda da cidade aparecer. -Que baderna é esta em nossa pacífica cidade? Quem são estes homens portando armas em um local tão pacífico? O guarda que hipocritamente proferiu estas palavras vestia uma armadura negra de couro sob uma pequena capa vermelha, e sobre a cabeça vestia um lenço xadrez de cores vermelha e preta, que devem ser as cores do reino. -Acabamos de tornar sua cidade mais segura. Aquele sujeito caído em duas partes era um ladrão, e aquelas peças que estão em sua mão não eram suas. Finéas disse isto seguro de estar falando com um homem da lei. Mas, que tipo de lei encontraram em Aratrustra? -A justiça dos homens aqui se dá apenas no palácio do sultão, forasteiro. Passarão impunes por esta atrocidade apenas por serem ignorantes de nossa lei. Se encontrar vocês perto de outro cadáver, serão todos presos. Percebendo que teriam de pagar o homem da lei, que olhava com malícia para eles enquanto falava, Aghyom, um dos cavaleiros, cedeu de seu ouro pelo bem do grupo. -E a parte do ladrão fica conosco por evidência- disse um dos guardas. Uma saudação e os dois grupos saem, deixando o corpo repartido para os amigos do morto carregarem. Triste, Halder percebe que está encontrando um mundo bem diferente daquele onde cresceu, no Vale das Névoas. No Vale a Religião, como chamam, rege as leis e os costumes. Não se preza o furto ou as trapaças como viu nesta terra de Aratrustra. Pesaroso pelas almas dos locais, passa entre eles sombrio. Seu grupo então escolhe uma estalagem e abriga os cavalos. A noite não tardará e será nesta noite que irão tentar descobrir se alguém sabe que tipo de pessoa poderia ter atacado o abrigo dos anões e levado a princesa consigo.
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Parece que vai dar trabalho achar essa guria.
PUM!
- publicado às 1:23 PM -
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